Miocardioptia séptica: uma entidade subdiagnosticada
A cardiomiopatia séptica (CMS) é subestimada em grau e relevância, embora até 10% dos choques sépticos fatais são devidos à falência cardíaca intratável. Pesquisas realizadas nos últimos anos foram insuficientes para definir a melhor abordagem e mudar o prognóstico da doença.
1. Descrever um caso clínico de CMS com alteração de ECG e enzimas cardíacas na unidade de emergência (UE).
2. Discutir a relevância do diagnóstico e tratamento precoces.
ICS, masculino, 55 anos, natural e procedente de Belo Horizonte, tabagista e etilista, admitido em UE com tosse produtiva, taquidispneia, febre de 39-40ºC, prostração, hipotensão e taquicardia. Constatado leucocitose, lactato:4,1mmol/L, Proteína C reativa: 500mg/dL, consolidação pulmonar em lobo superior direito, ECG com taquicardia sinusal e troponina (Tn) negativa. Realizada reposição volêmica e antibioticoterapia, sem resposta e, então, noradrenalina. Evoluiu com dor torácica típica, sudorese, piora da dispneia, ECG com supra de ST em DII, DIII, aVF, V5 e V6 e Tns de 0,2-5,9ng/mL. Cineangiocoronariografia mostrou hipocinesia leve difusa no ventrículo esquerdo, sem obstrução coronariana. Foi entubado e iniciado dobutamina. ECG normalizou 2h após o evento e Tn 3 dias após. Ecocardiograma do 6º dia sem disfunção cardíaca (DC) significativa.
A disfunção miocárdica induzida pela sepse é um fator preditor de morbimortalidade. Em 10-20% dos casos com hipotensão refratária há redução da fração de ejeção (FE) e dilatação de ventrículos nos 2-3 primeiros dias, levando à DC grave, baixa resposta à ressuscitação volêmica e elevação de Tn, com resolução em 7-10 dias. A Tn é um marcador de alta sensibilidade e especificidade da DC no choque séptico, mas não se comprovou relação entre prognóstico e seus níveis elevados. São comuns alterações de ECG semelhantes às da síndrome coronariana aguda (SCA), como supra ou infradesnível do segmento ST, onda Q, BRE novo, T apiculada e alargamento do intervalo QT, que tendem a desaparecer com o tempo. A abordagem consiste em tratar o agente infeccioso e estabilização hemodinâmica: manter pressão tissular adequada, reposição volêmica e vasopressores.
A CMS é um marcador de pior prognóstico nos quadros sépticos e um importante diagnóstico diferencial de SCA. Apesar de amplamente estudada, ainda é subdiagnosticada e subtratada devido à dificuldade em diferenciar da SCA e à rápida progressão para quadros graves.
Cardiomiopatia séptica, síndrome coronariana aguda, elevação de troponina, sepse.
Clínica Médica
Juliana Papatella Araujo, Luísa Carvalho Lovisi, Pollyanna Vieira Gonze, Marilucy Oliveira Santos, Amanda Mota de Oliveira Veiga